A criminalidade Informática

Tendo em conta a proliferação da criminalidade informática e a facilidade que qualquer um de nós tem em praticá-la, resolvi escrever este pequeno artigo, que serve também como reacção ao que se

costuma relatar nos meios de comunicação social acerca da dita criminalidade.

As mais recentes tecnologias provocaram um emergir de novos “problemas”.

Ao Direito cabe a dura tarefa de resolvê-los.

Será que é um “problema” o facto de uma pessoa aceder sem autorização ao computador de outra? É. Será que é um “problema” o facto de alguém copiar um programa informático protegido por lei sem para tal estar autorizado? É. E será que é um “problema” o uso de cartão de crédito alheio sem para tal estar autorizado? Também é. Tudo isto são problemas, a tudo isto o Direito tem de pôr cobro.

No entanto, um sector da sociedade parece não estar ciente de que todos estes problemas são… crimes. Sim, crimes.

Há de facto quem pense assim. Senão vejamos um caso paradigmático.

Nos EUA foi recentemente julgado e condenado a 46 meses de prisão (Março 1999) um hacker chamado Kevin Mitnick.

Kevin Mitnick é uma referência para os hackers, é uma lenda, é um mito. Sobre ele e o seu “grupo” de hacking (MOD – Masters of Deception) já se criaram páginas na Internet, escreveram livros e milhares de colunas nos jornais e revistas de todo o mundo( www.kevinmitnick.com e www.harpercollins.com ) . Quanto aos factos, as contradições são óbvias. Há quem diga que Mitnick não era um hacker especialmente dotado, e que as suas façanhas no início da década de 90, eram apenas fruto da inércia e sobretudo, do desconhecimento dos administradores de sistemas da época. Mas há também quem defenda a tese de que Mitnick era um fabuloso hacker, dotado de uma inteligência acima da média e com uma técnica de hacking raríssima. A nível de prejuízos as contradições são ainda maiores , circulando valores desde os 57 milhões de contos , alegado por algumas das empresas que foram vítimas dos crimes, tais como a Nokia, a Sun Microsystems, NEC e a Motorola, até 2 milhões de contos , defendido por Mitnick e o seu advogado, prevendo desde logo a dificuldade probatória característica neste tipo de crimes.

De facto Mitnick não era um criminoso vulgar, era um hacker, ou seja, um indivíduo que sendo um especialista informático pratica crimes informáticos  – é bom referir que na legislação portuguesa ainda não existe uma noção de “hacker”, noção muito importante para que se possa tratar com a devida sensibilidade um criminoso muito especial. Especial por não andar armado; Por ter uma grande procura no mercado de trabalho; Deter conhecimentos importantes para o futuro da sociedade; Não colocar em perigo os quatro bens jurídicos mais importantes do Direito Penal – Honra, a Vida, Integridade Física e a Liberdade; Por o computador ser o fim (objecto) e o meio (instrumento) do crime; Pela extrema facilidade com que se pode cometer um crime informático, bastando um computador.

Voltando ao caso Mitnick, que está a acontecer nos Estados Unidos da América e não em Portugal, devemos tirar as devidas ilações. Diz-se com frequência nos meios de comunicação social que Mitnick é ainda tido por advogados, juizes e polícias como algo de sobrenatural, de incompreensível, de inacessível, e de facto, a formação de um jurista não passa por um contacto, ainda que superficial com computadores. Os advogados, os juizes e as polícias devem é ser aconselhados por especialistas em informática de forma a poderem interpretar e aplicar melhor a lei.

Será Mitnick um bode expiatório, uma vítima de todo este processo? Será que as autoridades americanas estão a fazer desta acção um exemplo? Muita gente pensará que sim, talvez com razão, mas o que é facto é que alguém tinha de ser o primeiro, e alguém tinha de sofrer com a ira e histeria da sociedade contra este tipo de crimes. Era previsível que assim fosse, tal como é previsível que assim seja em Portugal.

Se tivermos em conta os crimes informáticos previstos no Código Penal e lhe juntarmos os crimes informáticos previstos em legislação penal avulsa, e atribuirmos um universo temporal de 1991-1997, verificamos que nesse espaço de tempo houve nove condenados pela prática desses crimes e a nenhum deles foi infligida a pena de prisão (a todos foi aplicada a pena de multa).

Podemos questionar a eficácia dos crimes informáticos tipificados na lei, da forma como esta está a ser aplicada na prática e se os juizes a sabem interpretar e entender. Mas algo é inevitável, em Portugal alguém há-de ser o primeiro a ser condenado a uma pena de prisão pela prática de um crime informático. As consequências , com a devida proporção, serão aquelas que já vimos. Haverá tal necessidade? Não estarão os hackers portugueses suficientemente informados para saberem que a sua actividade é ilícita? Será que o grande mal da criminalidade informática deriva de uma má administração de sistemas? Perante o que aqui foi escrito e o que ficou por escrever, só há uma coisa a acrescentar – Os computadores não têm vontade , as pessoas sim.


Autoria: Alexandre Barradas Guerreiro


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